quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

RESPIGAR

Mike Worrall


O que foi que eu fiz ao propício dia

quando tudo era possível:
desembrulhar sobre a íris
e nela mergulhar sem sede
outro acontecer

destemido intima o que te fere

(durante o pecado imaginado carne
– a minha – absorta de conseguido mel)

e sob a brandura dos fragmentos proclama
de extenuado sangue fantoche
o ardor ampliado no ror de gestos

e rente ao embrulhado mundo
vigia o que se avista do outro rosto:

o mar consistente do mundo, o ar
toda a vida, a adicta, bojando a jangada de pele
onde os humanos assomam e desaparecem;

e se tudo desse certo à mercê do desacerto:
o altar de seus mortos reinventado sob a justiça,

nesses ( exactos ) dias. de extática vertigem,
justamente,

julgando derivar outra fonte de terra e um vento
desassombra todos os ímpetos,

ainda sob o efeito,
a aranha,
na teia visceral em que vicias e arrebatas do probo nada a estátua,
esmaga;

e, em volta, o vento volta para dentro - rodopia -
aí, à revelia, onde és maré letal
e o vórtice contém nas suas margens:
o massacre
– imagem às imagens –
descontínuos crânios

caseiro material humano
num dos prováveis muitos alguidares,
e a imagem não vale o acto aquém do tempo,
durante as mil palavras ditas,
outrora,
o zelo o açougueiro,
agora,
restos de corpo no possível:
ser-se abertamente humano até rebentar a falha qualidade;

e, se não conseguires descer os olhos:
supõe
três noites de completo dia assinando
– o mais-querer a tudo – o mesmo nome,
se era tal-qualmente primoroso o exaltado rosto desenhar
sob a pele desenraizada ao predilecto inimigo

abreviado animal

sob a cinza ainda o âmbar encorpa
o clamor da terra colhendo o elmo de tédio,
indiferente ao rosto,
à beleza do rosto,
à fome e morte

do rosto nos restos:
a cegueira alastra sob o imune chilrear humano;

e, se tudo não basta:
transpõe agilmente
– aos bocados – a simpática
fruição dos cavalos
abatendo a terra:

dentro dessa pobre gente,
activa o hálito
da pétala nocturna.

5 comentários:

Luís Costa disse...

Só posso dizer: um excelente poema!
Parabéns!

Anónimo disse...

' caseiro material humano
num dos prováveis muitos alguidares,
e a imagem não vale o acto aquém do tempo,
durante as mil palavras ditas,
outrora,
o zelo o açougueiro,
agora,
restos de corpo no possível:
ser-se abertamente humano até rebentar a falha qualidade;'

muito bom o trecho (e tudo mais)

Graça Pires disse...

Um belo poema. Um beijo e os desejo de um BOM NATAL.

almajecta disse...

Palavras mui fortes.
Feliz Aniversário para o Gato e Próspero Ano Novo ao espelho.

Graça Pires disse...

Volto para desejar que o ano de 2009 seja um ANO BOM.
Beijos.